segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

A "Praça Sá da Bandeira" em Moçâmedes, e o Obelisco em memória do Marquês de Sá da Bandeira

 Esta foto mostra-nos a  "Praça Sá da Bandeira" e a  rua que à esq.  era a Rua Governador Calheiros, paralela à Rua das Hortas, Pescadores e Praia do Bonfim. Ao fundo os dois edificios iguais e pintados de escuro, são, à esq. aquele onde esteve até medos da década de 1950, a Escola 49, e à dt. a antiga cadeia.


A "Praça Sá da Bandeira" em Moçâmedes, era uma enorme Praça que foi inaugurada em 1869, tendo por epicentro o Obelisco em memória do Marquês de Sá da Bandeira, o político português que em 1836, após a queda o absolutismo e o triunfo de liberalismo em Portugal, não perdeu tempo e tomou importantes medidas legislativas sobre a abolição do tráfico de escravos e a protecção do comércio entre as colónias e Lisboa.

Esta Praça ficava no local que veio mais tarde a ser ocupado pela Escola Portugal (Escola 55 de Fernando Leal), hoje "Pioneiro Zeca". Na década de 1930, já no contexto político e institucional do Estado Novo, o Obelisco à memória do paladino da abolição do tráfico de escravos foi transferido para a Avenida da República, e colocado numa zona próxima do edifício da Alfândega (lado norte), onde ficavam os primitivos Correios Telégrafos e Telefones, tendo como vizinho um pequeno quiosque de ferro que existia na Avenida antes da construção do quiosque definitivo, conforme a foto a seguir nos mostra. E ali permaneceu até que em meados dos anos 1940 foi de novo transferido para o local onde ainda hoje se encontra, no centro de uma praceta rectangular, situada numa zona póxima do Bairro da Facada, entre a Rua das Hortas, a Rua Calheiros e a Rua Mendes Leal.




Nesta foto podemos ver o Obelisco enquanto vizinho de um pequeno quiosque em ferro, e do edifício da Alfândega, local para onde foi transladado em 1936. O edifício da Alfândega inaugurado antes de 1860, por esta altura tinha por vizinho o Jardim da Colónia, como se pode ver à direita, e ainda não o Cine Moçâmedes que iria ser construido na década de 1940. A Avenida da República estava exuberante de vegetação como esta foto e a foto a seguir apresentam.



Nesta foto de finais dos anos 1930, podemos ver o local exacto da Avenida da República para onde foi transladado o Obelisco em homenagem do Marquês de Sá da Bandeira. Podemos ver também o primitivo Quiosque em ferro ali existente, entre o Obelisco e o edifício da Alfândega. Nesta altura a Avenida ainda não chegava ao topo, a sul, subindo a encosta paralela à Fortaleza. nem o Palácio da Justiça existia. Vista parcial da cidade de Moçâmedes nos anos 1970, com a Praça e o Obelisco a Sá da Bandeira, junto do Bairro da Facada.

http://www.africanos.eu/ceaup/uploads/EB087.pdf

Com relação a este obelisco e à "Praça Sá da Bandeira", onde pela 1ª vez foi erguido este monumento, podemos lêr num artigo publicado por Manuel Júlio de Mendonça Torres no Boletim Geral do Ultramar XXX - 348 e 349, de Junho-Julho de 1954, págs. 125 a 129, na parte dedicada aos edifícios e obras municipais existentes neste ciclo, sob a designação "Conspecto imobiliário do Distrito de Moçâmedes no ciclo de 1850 a 1879", o seguinte:

...Consta no Relatório do governador Costa Cabral, de 19 de Junho de 1877, que num dos ângulos da Praça Sá da Bandeira se erguia um pequeno prédio, já concluido, "servindo de Casa da Câmara". Supomos que a casa a que se refere Costa Cabral é aquela em que hoje está instalada a Administração do Concelho. Só muito mais tarde é que a Câmara Municipal fora definitivamente instalada no edifício em que funciona hoje os serviços dos Paços do Concelho. Devia ter ficado pronto e a funcionar, segundo o Graça, de 13 de Julho de 1869, no dia 1 de Janeiro de 1870. Outro ângulo da Praça estava ocupado pela casa, já em paredes e telhado, destinada a "Casa do Tribunal". 

...Observava Costa Cabral que esta casa, cuja conclusão já pouco importaria era indispensável, por ser Moçâmedes sede de comarca. Informava também que as dimensões desta casa eram acanhadas para ter o destino que lhe estava dado; faltavam divisórias, como sala para julgamento, gabinete para juiz e delegado, dois cartórios, sala para réus e outra para testemunhas; para tudo isto não tinha capacidade. Desconhecemos se foi nesta casa que funcionou o primeiro tribunal da comarca. No terceiro ângulo, alvitrava o governador seria construida uma casa com condições de "Escola para o sexo masculino", mas nada se fez. Sobre o assunto, refere, já expusemos o que bastava no capítulo "Os serviços de instrução". E continua: no quarto ângulo tinha sido construida uma casa, que já estava em paredes, destinada a "Cadeia". Era impróprio o lugar porque nessa casa se haviam de aglomerar indivíduos de hábitos desmoralizadores, sendo, portanto, inconvenientíssima a vizinhança, se na mesma praça fosse construida a Escola, como se pensou.

 ...Segundo o relatório do governador Graça, de 13 de Julho de 1869, a "Praça de Sá da Bandeira" media 14.000 metros quadrados. Parece-nos exagerada tal área. Presumimos que esta praça tivesse sido limitada pelo gradeamento colocado tempo depois, ficando, por este motivo, situados fora dela os edifícios construidos em cada um dos seus ângulos.

 ...A Praça Sá da Bandeira, de vastas dimensões e confinada pelo seu aparatoso gradeamento, fora aberta no local onde hoje se erguem a "Escola Portugal" e algumas outras edificações. No centro via-se, erecto, um obelisco dedicado à memória do estrénuo libertador dos escravos nos nossos domínios ultramarinos. Há muitos anos, mas ainda nos nossos tempos, efectuara-se definitivamente a retirada dos gradeamentos e fora, outro ssim, transladado o obelisco para a Avenida da República. próximo do sítio quase fronteiro ao antigo edifício dos Correios. E, ultimamente, há bem poucos anos, determinou a Câmara a deslocação daquele monumento para uma praça que havia sido aberta a Nascente da cidade, entre as ruas Calheiros, Hortas e Mendes Leal. 



 Aqui o Obelisco em memória do Marquês de Sá da Bandeira já se encontrava no local onde presentemente se encontra, ou seja, no centro de uma praceta rectangular, situada numa zona póxima do Bairro da Facada, entre a Rua das Hortas, a Rua Calheiros e a Rua Mendes Leal. Como foi atrás referido, o Obelisco foi transferido para esta Praceta, perto do Bairro da Facada, em meados da década de 1940, a partir da Avenida da República, onde se encontrava desde meados dos anos 1930, tendo já antes sido transladado para ali, a partir da "Praça Sá da Bandeira", onde pela 1ª vez foi erigido em 1869, e onde ocupava todo o quarteirão que foi ocupado pela Escola Portugal, hoje Escola Pioneiro Zeca.

 
O OBELISCO erigido à memória de Sá da Bandeira compõe-se de uma coluna quadrangular de pedra, adelgaçada na extremidade, assente sobre um pedestal, também de pedra, em cujas faces se lêem as inscrições seguintes: AO DEFENSOR DA LIBERDADE 1869 . ATAQUE AO ALTO DA BANDEIRA EM 8 DE SETEMBRO DE 1832.1 AO PROTECTOR DAS COLÓNIAS O GENERAL SÁ DA BANDEIRA "

O transporte do obelisco à memória do Marquês de Sá da Bandeira, desde a Avenida da Republica para esta Praça, naquele tempo anterior em que Moçâmedes não dispunha ainda de muitos veículos automóveis, foi efectuado com todos os cuidados sobre vagonetas, que deslizavam sobre carris (linhas férreas) que para o efeito estenderam-se temporariamente pelas ruas da cidade, fazendo a ligação entre os dois locais. Era comum o uso de vagonetas para o transporte de materias de construção naqueles tempos mais para trás. Aliás era através de vagonetas deslizando sobre carros de ferro, que as mercadorias se deslocavam da ponte de embarque e desembarque para a Alfândega e vice-versa. Mas existem outras referências à "Praça Sá da Bandeira".

Encontramos dentro do período de actividade do professor Francisco Rodrigues Pinto da Rocha, filho de um dos colonos fundadores oriundos de Pernambuco, Brasil,  um relatório de Manuel Martins Contreiras, datado de Junho de 1893, que nos diz que a escola que este professor leccionava, a melhor da Província, ficava situada na Praça do Marquês de Sá, e era propriedade do Estado. As carteiras tinham banco solto, assemelhando-se às que se usavam na França, as do sistema Lenoir. Na realidade, por esse tempo era da França, e especialmente de Paris, que todas as novidades vinham. França era como que um farol, um modelo para a humanidade, com seus valores iluministas de "Liberdade, Fraternidade e Igualdade". 

Quero apenas acrescentar que o local onde foi construída a Escola Portugal, ou Escola n 55 de Fernando Leal, hoje Escola "Pioneiro Zeca" convergia no tempo colonial com as ruas  Governador Calheiros, a que passa pela Câmara Municipal, Rua da Fábrica ( a que sobe para o Parque Infantil) ,  e ocupava todo um imenso quarteirão. Foi no seu epicentro que foi erguido um Obelisco ao Marquês de Sá da Bandeira, o liberal progressista que no dia 10 de Dezembro de 1836, na sequência da Revolução de Setembro em Portugal, decretou a abolição do tráfico de escravos. Mais tarde quando foi construída a Escola Portugal, o Obelisco transitou para a Avenida da República, para o lugar onde se encontra o Quiosque que conhecemos por Quiosque do Faustino. Mais tarde ainda, nos anos 1940, foi de novo dali retirado e colocado na Praceta onde hoje se encontra, muito perto do Bairro da Facada. Na mesma direcção e na ponta que convergia para a nova rua que entretanto se abriu, a Rua da Fábrica, ficava a Cadeia. Penso que este aspecto ficou esclarecido.


Quem foi o Marquês de Sá da Bandeira?  e qual a sua importância para Moçâmedes?


O marquês de Sá da Bandeira (Bernardo de Sá Nogueira de Figueiredo, 1.º barão, 1.º visconde e 1.º marquês de)  foi o político português que após a queda o absolutismo e o triunfo de liberalismo em Portugal, no decurso da vigência do Partido Progressista, não perdeu tempo e através da lei de 10 de Dezembro de 1836, aboliu o tráfico de escravos para o Brasil e Américas em todos os domínios ultramarinos,  e tomou importantes medidas legislativas sobre a protecção do comércio entre as colónias e Lisboa, proibiu a exportação de escravos em todos os domínios ultramarinos, e punia os transgressores com severas penas que incluiam o degredo, multas, a incapacidade de servir em empregos nacionais e trabalhos públicos.

Tal abolição ficou a dever-se, por um lado, à penetração em Portugal dos ventos de "Liberdade, Fraternidade e Igualdade" que se espalharam por toda a Europa e pelo mundo, e chegaram a Portugal, com os ventos soprados pela Revolução Francesa que contribuíram para revolução de 1820 e para a queda do absolutismo monárquico, e o triunfo definitivo do liberalismo em 1834, após 14 anos de lutas entre liberais e absolutistas pela sucessão ao trono, que culminaram com a fuga para o exílio de D. Miguel. Mas foram sobretudo as pressões da Inglaterra, não tanto por razões humanitárias, mas devido à revolução industrial, ao interesse nas colónias de África, a juntar-se ao interesse daquela potência em exportar as novas máquinas a vapor, vieram aliviar o trabalho humano permitindo passar a encarar o escravo liberto como um potencial consumidor.

O Portugal falido e desmantelado após um meio século de conflitos de toda a espécie, não possuía condições para se impôr aos traficantes, e foi com a celebração, em 3 Julho de 1842, do tratado luso-britânico para a abolição total do tráfico, que as marinhas dos dois países passaram a colaborar nessa empreitada, com o direito recíproco de visita aos navios suspeitos de negreiros. É claro que até 1836, a coroa portuguesa absolutista arrecadara lucros do vil negócio, por via das licenças e impostos alfandegários e não só, mas o povo português metropolitano e das ilhas, continuava na sua maioria rural e analfabeto, a viver na mais cruel das misérias.

É nesta década que Moçâmedes vai começar a erguer-se, já após a abolição, e no quadro de um novo paradigma colonial de fixação de famílias portuguesas e de desenvolvimento económico da colónia,  primeiro como um rudimentar Forte/Presídio, mais tarde como uma vilinha airosa e progressiva, após a chegada dos colonos de Pernambuco, Brasil, em 1849 e 1850, seguidos dos olhanenses, que por sua conta e risco começaram a chegar àquelas paragens desérticas a partir de 1861. 

Moçâmedes e o Marquês de Sá, representam, pois, aquele momento de ruptura com uma situação que se arrastara por longos séculos, durante os quais os altos cargos da administração civil e militar que foram sendo ocupados em Angola eram-no por gente ida do Brasil, muitos deles enviados para  ali como degredados, gente não grata a cumprir as mais diversas penas, que acabaram ali ficar e por se envolveram no tráfico, juntando-se a mulheres negras, tendo filhos mestiços, seus continuadores, adquirindo grande influência junto dos sobas do interior, e alcançando poder e prestígio. Do vil negócio que enriqueceu o Brasil e as Américas resultou a formação de uma burguesia enriquecida com em Benguela e em Luanda, burguesia essa que lutou por todos os meios para manter o negócio  após a abolição, e que via como gentes não gratas, a fixação das primeiras famílias brancas vindas de Pernambuco para Moçâmedes, no quadro do novo paradigma colonial que começava a desenhar-se, com o tráfico ilegalizado e perseguido.  A exportação em grandes quantidades de marfim, cera, goma copal, urzela não interessava aos traficantes nem aos seus concessionários, uns e outros habituados aos grandes lucros, com pouco esforço, oferecidos pela escravatura.

A fundação  de Moçâmedes esteve , pois,  intimamente ligada à abolição, não obstante o processo moroso que se arrastou até que Brasil encerrasse seus portos à importação de escravos, em 1951, favorecendo a comercialização de produtos lícitos, e o tráfico fosse decisivamente reprimido através da vigilância marítima internacional, chegando ao fim. O tempo pós 1836 em Angola, foi aliás um tempo em que famílias influentes de Luanda e de Benguela emigraram para o Brasil e com elas levaram os capitais que detinham.

O tráfico, é preciso que se diga, envolveu brancos, esmagadoramente oriundos do Brasil, mas também negros e mestiços, que dele tiraram o proveito, nesses tempos em que o tráfico Atlântico de escravos veio substituir o tráfico árabe que vinha sendo feito desde há muitos a séculos antes do século XV.  E não obstante o Decreto da abolição, a lei continuou a permitir a importação terrestre, e tornou possível, numa primeira fase, o fornecimento de mão-de-obra à colónia.

O envolvimento do Brasil no tráfico foi tal que Angola era vista como "a colónia da colónia", e muitos governadores iam do Brasil para Angola, e mesmo já após a independência da colónia brasileira,  o governo do novo país chegou a enviar para Angola 3 navios de guerra para proteger os navios negreiros que operavam na área, na defesa do tráfico.   O desespero das burguesias urbanas de Luanda e Benguela, que concentravam nas mãos a ligação ao comércio internacional foi tal, que se chegou mesmo a pretender unir Angola ao Brasil. E em 1835, seria um brasileiro um dos líderes de uma revolta, em parte motivada por rumores, de que Portugal tentava abolir o tráfico de escravos.  . Como foi dito atrás este paladino da abolição teve que lutar quase até à morte para que as colónias de África encontrassem o caminho certo, face aos interesses instalados dos traficantes e de um negócio que só foi possível com a arrastada complicidade dos chefes africanos, que representavam 95% da população.

 Daí a simbologia deste OBELISCO que aqui expomos!



 Pesquisa e texto de MariaNJardim .

sábado, 15 de fevereiro de 2020

Jovens senhoras de Moçâmedes da JIC e do grupo católico "Sagrado Coração de Jesus". O movimento de Encontros de Jovens Shalom


 Jovens senhoras de Moçâmedes da JIC
  Jovens senhoras de Moçâmedes da JIC
 Jovens senhoras participantes do grupo católico "Sagrado Coração de Jesus"
 Jovens senhoras participantes do grupo católico "Sagrado Coração de Jesus"



Com o Estado Novo, desde 1926 houve o renascimento católico. Em Angola foram fundadas 29 novas missões até 1940. Em 1940 o governo assinou com a Santa Sé 3 acordos: A Concordata, Acordo Missionário e o Estatuto Missionário. Salazar referiu:

"Não se pode pôr, entre nós, o problema de qualquer incompatibilidade entre a política da Nação e a liberdade de evangelização, pelo contrário, uma faz parte da outra."

É dentro deste espírito de cooperação estatal com a Igreja católica que de 1930 a 1960, mais de 20 Congregações missionárias enviaram pessoal para Angola: Beneditinos, Beneditinas, Doroteias, Irmãs do SS. Salvador, Irmãs de la Salette, Capuchinhos, Franciscanas Missionárias de Maria, Reparadoras, Teresianas, Redentoristas, Ordem Trapista, Irmãozinhos de Jesus, Irmãos Maristas, Irmãs do Amor de Deus, Dominicanas de Se. Catarina, Espiritanas, Missionárias Médicas de Maria, Dominicanas do Rosário, Irmãs da Misericórdia.

Ler mais: https://reflexao.webnode.com.pt/cplp-comunidade-dos-paises-da-lingua-portuguesa/angola/
 Desde finais do século XIX que a fragilidade vivida no quadro da secularização veio acompanhada da vontade de revitalização e de um ímpeto associativo dos católicos, de que a Acção Católica Portuguesa foi, de certo modo, herdeira.  A ideia de um apostolado total, deu origem a quatro organizações (Liga dos Homens da Acção Católica, Liga das Mulheres da Acção Católica, Juventude Católica e Juventude Católica Feminina); e de acordo com os chamados “meios sociais” - agrário, escolar, independente, operário e universitário -, dando origem a 20 organismos especializados.  A ideia de um catolicismo militante remonta a 1933, o ano em que nasceu em Portugal a Acção Católica, um catolicismo militante em prol da  “recristianização cristã” da sociedade. 






O desenvolvimento da formação e reflexão teológicas, a preocupação com o enraizamento social do trabalho de cristianização, a activa participação nas dinâmicas internacionais ou supranacionais do catolicismo, foram factores que contribuíram decisivamente para conferir ao movimento católico português alguns novos traços nos anos 50 a 70, em especial: a formação humana, cívica e religiosa de várias gerações de católicos, conforme a uma espiritualidade mais incarnada e cristocêntrica, pese embora o peso do marianismo nas devoções dos movimentos de Acção Católica; o desenvolvimento de um catolicismo social reformista, partindo do estudo e procura de soluções para a realidade nacional, bloqueada pela persistência política do Estado autoritário após a II Guerra Mundial; o aparecimento de novas elites católicas nos mais diversos sectores da sociedade, em particular universitário, intelectual e cultural, mas também operário e de novos sectores profissionais, a par da emergência de novas lideranças e dinâmicas sociais, a nível da juventude, das mulheres, das famílias e do movimento sindical e patronal, entre outros.

Nos anos 70, o esgotamento do paradigma de movimento católico que a ACP corporizou explica o seu desmembramento como corpo orgânico em 1974, sendo que a realização do II Concílio do Vaticano constituiu um importante ponto de viragem neste processo. Muitas das perspectivas teológicas e pastorais que o Concílio viera reconhecer e proclamar tiveram na vida e trabalho da Acção Católica, em todo o mundo, um pioneirismo e um alicerce que, no longo prazo, explicam a sua secundarização, mormente o reconhecimento do valor pleno do apostolado dos leigos, sem necessidade de recurso ao mandato episcopal ou o valor da liberdade religiosa e do pluralismo eclesial e social.

Mas também foram desta época os movimentos católicos influenciados pelas Encíclicas Papais de João XXIII (Vaticano II) que passaram a estar presentes no meio juvenil, atraindo-os a si com a organização de eventos (bailes paroquiais, missas yé-yé, programas de assistência social etc).

Em meio a um mundo em transformação, a Igreja toma posição através de alguns párocos que rompendo a tradicional resistência à mudança, passaram a procurar e a chamar a si os jovens, atraindo-os para festas em salas de convívio paroquial. O objectivo era proporcionar-lhes uma opção, através de festas e bailes saudáveis e alegres, dentro de um contexto cristão, num mundo onde a juventude estava perdendo referências, resgatando valores familiares, a espiritualidade da juventude, a moral cristã, o sentimento de cidadania, e a promoção de valores que levassem ao fortalecimento da sociedade.

Em Moçâmedes foi o Padre Martinho Noronha um dos promotores do movimento desta causa dedicadas aos jovens paroquianos, que procurava, naturalmente desviá-los dos "males" trazidos por uma época marcada por um turbilhão de mudanças. Este foi o tempo da introdução entre a juventude do vício da liamba/haxixe, ou cannabis, entre os jovens de Angola, flagelo para eles e para os pais que não mais tiveram sossego.

Outro exemplo foi o Movimento de Encontros de Jovens Shalom, que se espalhou por várias cidades de Angola, com o Padre Luís Carlos nomeado seu Assistente Geral. Ordenado em 1968 este jovem padre foi sacerdote em Sá da Bandeira, onde congregou e entusiasmou gente jovem, transformou as "missas da Laje" em verdadeiras festas de juventude


                                No Lubango (Angola). Chamavam-lhe as "missas yé...yé..." 



                                No Lubango (Angola). Chamavam-lhe as "missas yé...yé..."


Em 1972, com outros jovens, o Padre Luís Carlos fundou uma Comunidade voltada para a evangelização da juventude nas várias dioceses de Angola. Em 1973, fez especialização em pastoral juvenil, pedagogia e dinâmica de grupos em Madrid, onde conheceu e assumiu a "educação libertadora". Assim, unidos pelo mesmo ideal, jovens juntaram-se e formaram este movimento que mais tarde se expandiu para Portugal e Brasil. Shalom era a palavra com que estes se identificavam, que significa harmonia, unidade, benção, alegria e paz. O objectivo era criar espaços para oração e partilha de vida, criar laços mais profundos de amizade entre os elementos do grupo permitindo um crescimento individual e também em comunidade.


Toda esta abertura da Igreja estava relacionada com as mudanças trazidas pelo Concilio Vaticano II que se estendeu e chegou ao fim em 1965, ficando marcado pela reunião do Papa Paulo VI, em Julho de 1970, com lideres dos movimentos independentistas das colónias portuguesas de África. A Encíclica “Populorum Progressio”, acolheu a promoção de todos os povos, nomeadamente os que viviam situações de dependência colonial ou de subdesenvolvimento. Eram mudanças que preocupavam o regime. Angola estava em guerra, havia censura, a polícia política (PIDE) estava atenta à formação de todo e qualquer Movimento, incluso religioso. Na América Latina progredia a Teologia da Libertação, em paralelo com os movimentos políticos libertadores, na defesa dos pobres e da justiça para todos, o respeito aos grupos étnicos indígenas e africanos, além de outras causas de emancipação social, económica e política. Este movimento elaborou teorias e formas concretas de viver uma nova forma de ser Igreja, que além de questionar as bases tradicionais da instituição eclesial e da organização política, contribuíram para o avanço da identidade latino-americana.

A geração de 60 foi por toda a parte protagonista de uma revolução nos costumes cujos resultados são vivenciados hoje. Foi então que se descobriu lá mais para diante como o rock podia emanar sensações africanas, e lá para os anos 70, incluso algumas letras causticas contra o regime. (1)



MariaNJardim




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Estas fotos são pertença dos nossos amigos e conterrâneos moçamedenses, pelo que ninguém, excepto aqueles a quem as mesmas dizem respeito, poderá daqui retirar algo sem a devida autorização, incorrendo em falta quem o fizer. Também o texto tem direitos de autor que devem ser respeitados.