A CHEGADA A MOÇÂMEDES 
Quando a barca brasileira "Tentativa Feliz" chegou a Moçâmedes, 
capitaneada pelo Brigue da Marinha Portuguesa "Douro", a povoação era 
habitada por meia dúzia de feitores europeus, bastantes naturais e 
escravos que receberam os colonos com grandes manifestações de regozijo,
 como descreveu o encarregado do Governo Geral major Ferreira Horta:
 "...Os moradores de Mossâmedes receberam os colonos, como se recebe 
hóspedes,  amigos e irmãos tão úteis: Portugueses que vem regar com seu 
suor as férteis e incultas terras d'Africa. ( conf. Boletim Oficial de 
Angola, n 204, de 25 Agosto 1849).
Da  parte daqueles que acabaram de chegar a satisfação não foi menor. 
Tudo estava preparado para os receber. Depois de tão árdua e fastidiosa 
viagem, constituiu apreciável prémio o terem encontrado, dentro das 
parcas possibilidades de que se dispunha, instalações para se 
albergarem.
A 5 de Outubro começaram a desembarcar as mercadorias dos navios, tendo 
todos, moradores, colonos e tripulação, ajudado nas operações de 
descarga, bem como na distribuição das pessoas pelos alojamentos, e na 
armazenagem dos viveres que restaram da viagem. 
Enquanto junto à praia se procedia a esta azáfama os encarregados da 
recepção e do Presidio acompanharam Bernardino Abreu e Castro às margens
 do rio Bero, onde depois de elucidarem o director dos colonos, 
apreciaram, e esboçaram em conjunto, os moldes em que deveria decorrer a
 repartição do terreno pelos vários elementos componentes da colónia.
Na mente do grande chefe o tempo não poderia correr inutilmente, As 
terras ansiavam por quem delas cuidasse e os homens aspiravam a 
recuperar todas as despesas até então encetadas.
A 16 de Janeiro partiram com destino a Luanda, a barca e o brigue, 
depois de terem cumprido a missão que lhes havia sido anteriormente 
destinada. A bordo do Brigue seguira Bernardino Abreu e Castro. O 
intuito era de pessoalmente conferenciar com Adrião Acácio da Silveira 
Pinto, Governador Geral, e nessas conversações assentarem ambos sobre 
medidas a tomar.
António Sérgio de Sousa, governador nomeado para o distrito de 
Moçâmedes  já se encontrava em Luanda, o que proporcionou um acerto na 
coordenação dos objectivos a levar a cabo no estabelecimento acabado de 
nascer.
A permanência de Bernardino em Luanda prolongou-se por quase dois meses,
 tempo que foi absorvido pelas reuniões conjuntas de trabalho e por 
proveitosa deslocação às margens do Cuanza , onde teve o ensejo de se 
inteirar de problemas ligados à agricultura e à região do Bengo para 
conhecer os moldes como se cultivava a cana-de-açúcar, donde por sinal, 
colheu grande quantidade de sementes e plantas de cana sacarina para 
transplantação. Regressou a Luanda impressionado com aquelas regiões, 
porquanto como referiu:
"Nunca vira vegetação mais pomposa do que a das extensas margens 
d'aquelles rios, nos quaes quasi sem cultura vegetavam admiravelmente a 
cana do assúcar, o milho, o feijão, o guandu, a bananeira, o ananaz, o 
dendém (...), e outras árvores de fructo, de madeira e de lenhas."
 Tomando contacto com a realidade angolana, numa observação que apesar 
de rápida o seu espírito perspicaz abarcou, Bernardino  Freire conseguiu
 em poucos dias de estada na capital tirar algumas conclusões para 
tentar destruir o pensamento dos que vivem na Europa, e que de África só
 conheciam a insalubridade do clima. Para tal preconizava que, por meio 
de habitações cómodas, pela destruição dos lugares pantanosos, pelo fogo
 que devasta ervas daninhas e purifica a atmosfera, aliada a medidas de 
elevação humana, citando como exemplo o acabar com excesso de bebidas 
alcoólicas, e uma alimentação racional, bem como "o uso de banhos de 
água doce", os homens poderiam viver em África do mesmo modo como o 
faziam nas metrópoles europeias.
Antes de regressar a Moçâmedes, pede ao director da colónia, ao 
Governador Silveira Pinto,  que mandasse vir do Egipto sementes de 
algodão, uma vez que pensava ser o clima do sul propício a tal cultura, 
pedido que foi satisfeito. E pouco depois, na companhia de Antonio 
Sérgio de Sousa, seguiu com destino a Moçâmedes, onde desembarcaram a 12
 de Outubro de 1949.
A FIXAÇÃO DA COLÓNIA
Chegado a Moçâmedes, António Sérgio de Sousa tentou sempre cumprir o 
programa que previamente lhe fora imposto pelo Ministério da Marinha e 
Ultramar, bem como dar largas à sua imaginação nos pontos que durante 
execução prática era de incongruente resolução.  ????
As "instruções de 26 de Abril de 1849" que lhe foram entregues quando da
 sua nomeação em Lisboa, preconizavam a criação de um Conselho Colonial,
 que coadjuvaria o governador no desempenho das duas funções. Este orgão
 seria composto por quatro elementos eleitos pelos colonos e era 
presidido pelo governador, que tinha voto de qualidade.  Deveria 
reunir-se sempre que surgissem casos de guerra;  nas relações externas 
com os sobas da região;  na administração da justiça, criando na ocasião
 própria um lugar de juiz ordinário, bem como na nomeação, substituição e
 exoneração de funcionários subalternos. Além destes pontos que 
obrigatoriamente dariam origem a uma reunião, o Governador tinha poderes
 para convocar o conselho colonial sempre que achasse 
conveniente.                                                                            
Segundo uma carta assinada por Bernardino Freire de Figueiredo Abreu e 
Castro, e datada de 18 de Outubro  daquele ano, nessa votação saíram 
eleitos,  além dele próprio,  os colonos José Leite de Albuquerque, José
 Maria Barbosa, e Manuel José Coelho de Freitas, tendo o último recusado
 o lugar alegando falta de saúde e sido substituído por José Gonçalves 
da Silva Soares.  (Conf. Boletim Oficial de Angola 220 de 15 de Dezembro
 1919)
Quatro à chamada de Bernardino Freire para ocupar o lugar no conselho 
colonial, duvida-se que tivesse sido feita por votação. No entanto, por 
falta de documentos, como a acta da sessão eleitoral, não é possível 
adiantar mais. A dúvida apareceu quando da analise das instruções 
fornecidas a António Sérgio, onde se verificou que em artigo transitório
 se nomeava como membro que necessariamente tinha de figurar no  
conselho, Abreu e Castro. Será que Sérgio de Sousa quis correr o risco 
de uma votação para se certificar da popularidade de Bernardino, bem 
como na confiança que nele depositavam os seus colonos?  Duvidamos que 
se tivesse processado assim.
Este orgão administrativo que foi o Conselho Colonial, criado em 
Moçâmedes em 1849, foi a substituição primária que precedeu o 
aparecimento da Câmara Municipal de Moçâmedes, a terceira mais antiga 
edilidade da província de Angola.
 OS PRIMEIROS TEMPO DA NOVA COLÓNIA
Segundo as «instruções» de António Sérgio de Sousa e do Conselho 
Colonial, começaram a sua actividade pela divisão e a distribuição dos 
terrenos aos colonos agricultores. Este acto que poderia ter originado 
uma onda de descontentamento, foi bem aceite por todos, uma vez que na 
mente de cada um dominava a ideia de que os terrenos possuíam as 
condições óptimas para laborar as culturas que desejavam. Presidiu à 
divisão um elevado espírito de boa fé, e só o futuro pode dizer que na 
realidade, uns tivessem sido beneficiados pela sorte, enquanto outros, 
por mais esforços que envidassem, tiveram sempre como aliada a dura 
adversidade.
A várzea do rio Bero, a poucos quilómetros da foz, foi toda retalhada e 
entregue a cada um dos colonos, com a obrigação de a arrotearem e 
prepararem para a cultura da cana-de-açúcar e produtos hortícolas.  Como
 afirmou Bernardino Freire, Moçâmedes foi nos primeiros dias  um 
«bolício» , onde se edificavam casas, se arroteavam terras, se montavam 
olarias, sempre com a  colaboração de escravos, que, por entre os 
colonos, conduziam em carros de bois «caibro, junco,e táboa» à medida 
das solicitações.
A 1 de Outubro de 1849, no local dos Cavaleiros, onde Bernardino Abreu e
 Castro iria construir a sua fazenda agrícola, deu-se a primeira 
manifestação de regozijo, concentrando-se ali colonos e autoridades 
administrativas para assistirem o lançamento à terra moçamedense da 
primeira "semente de cana".   Esta foi a espécie agrícola em que todos, 
colonos e entidades governamentais, depositavam as grandes esperanças, 
mas o tempo haveria de demonstrar que não seria a ideal.
O 1º de Janeiro passado pelos colonos em terras angolanas rompia, quando
 a colónia foi atacada pelos povos do Nano, do Quilengues e do Dombe 
Grande, o que veio aumentar ainda mais as dificuldades.  Não só se tinha
 que encetar um esforço em prol da agricultura, como ainda resguardar 
aqueles que trabalhavam, das investidas dos povos vizinhos, que se 
rebelavam muitas vezes contra a presença dos europeus.
"Não esperem que lhes hei-de contar maravilhas em respeito à Colónia, 
sobre que estão fitos os olhos dos portugueses que lá andam por essa 
América, e que estão à mira do modo como esta se estabeleceu, para virem
 assinar-se-lhe, ou estabelecer outras."    In Crónica de Bernardino 
Abreu e Castro datada de 10 de Dezembro de 1849 in Boletim Oficial de 
Angola n 229 de 16 Fevereiro 1850.
Estas palavras de Abreu e  Castro são demonstrativas das grandes 
expectativa que rodeava a colónia. Se deste ensaio surtissem os efeitos 
por todos almejados, o exemplo poderia ser repetido, dando origem a um 
afluxo de imigração notável, com o consequente povoamento e 
desenvolvimento da possessão. Arrancando ao seu pensamento aquela ideia,
 prossegue Abreu e Castro:
"Não serei como frade, que querendo convencer um rapaz para abraçar a 
vida monástica, lhe dizia que no seu convento havia  dous entrudos, 
ocultando-lhe que tão bem havia dias quaresmas "
In
 Crónica de Bernardino Abreu e Castro datada de 10 de Dezembro de 1849 
in Boletim Oficial de Angola n 229 de 16 Fevereiro 1850.
Com tão engenhosa comparação pretende o autor ficar ilibado de futuras 
acusações, retratando sempre quanto possível as duas fases da tarefa a 
desempenhar.